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Joana

Eu só te peço uma coisa... eu vou te contar a minha vida, você pode publicar mas eu só não queria me ver em um retrato. Eu não gosto de retrato. Tudo bem? . Pode fotografar a casa, os móveis, tudo mas eu não gosto de fotografia minha, não gosto de me ver. Aquele retrato ali na parede não sou eu, então pode fotografar. Deixa eu pegar uma foto minha antiguinha pra você me ver jovem... mas pra falar a verdade eu nunca gostei de retrato. Só tenho essa foto pequenininha. . Minha filha, eu me chamo Joana, tenho 60 anos e nasci em Butuca no patriarca, vim para Sobral aos 10 anos ser “pé de fogão” de família rica. Em toda casa que eu entrava eu era uma frutinha verde, era assim que os homens diziam você acredita? . Eu fugi a vida inteira desses homens, os bichos ficavam atrás da gente. Por isso eu sempre dormia na minha casa, eu tinha medo. . A minha virgindade está comigo até hoje. Eu sabia que se eu fizesse aquilo eu ia ter filho e eu não f
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Diana

Sou Diana,  a mais nova de uma família de cinco irmãos. Tenho 35 anos, dois filhos e 16 anos de casada.  A rua da palha é meu lar desde sempre, nasci aqui. Sou fruto do amor de Isabel e Raimundo, através dessa paixão dos meus pais herdei um amor imenso por esse lugar. . A minha história está profundamente ligada com a história do meu pai. Infelizmente, ele já se foi. Ainda dói muito, não consigo falar disso sem chorar, sem lembrar dos momentos que passei com ele. . Quando ele adoeceu eu fui a filha que pude me dedicar para cuidar dele integralmente. Eu mudei a minha vida inteira, sai do emprego, quase não conseguia estar com meu esposo, com minha filha, me dediquei a cuidar do pai inteiramente. . Ele confiava muito em mim, sabia que eu falava com os médicos, organizava a medicação, que eu brigava quando fosse preciso, que eu não ia deixar ninguém cuidar dele pela metade. Isso trouxe uma conexão muito forte entre a gente. Eu virei confidente, filha, amiga, enfermei

Denise

Eu me organizei a semana inteira para estar aqui com as minhas irmãs e contar as nossas histórias junto, ouvindo umas as outras. Aqui na rua somos conhecidas como a “força D”. Denise, Diana e Daniele. É muito especial estarmos todas reunidas. . Sou a Denise, tenho 40 anos e essa rua é tudo para mim. Lembro que na enchente de 2009 tivemos que sair daqui e eu ficava contando as horas para voltar, para ver meus amigos, para passear no rio. . Eu sempre fui a mais afoita de todos os filhos. Era eu que fugia para as festas, que pulava a cerca, eu pensava assim: eu vou aproveitar bastante essa festa porque quando eu chegar pela manhã eu vou apanhar tanto do pai que eu vou fazer valer a pena. . Quando o pai sabia onde eu estava ele ia lá me pegar e eu voltava com ele na garupa da bicicleta. Quando chegava em casa ele olhava para mim e eu sabia exatamente o peso. . Sempre fui a mais danada, a mais festeira, a mala animada. Até hoje a minha casa é conhecida como a casa da f

Isabel

Sabe o que eu fico tanto fazendo nessa janela? Eu fico imaginando que a vida é boa e que o sofrimento vai passar. É o meu lugar preferido aqui de casa. . Eu sou Isabel, tenho 79 anos, tive oito filhos mas apenas cinco permaneceram vivos. Dois morreram cedinho e outro foi um aborto natural. Um dos bebês morreu no parto, minha mãe era parteira e ele já nasceu sem vida.  Eu nasci em um vilarejo no interior do Moraújo chamado Enjeitado. É um lugar na beira de um açude.  Açude que eu tomei muito banho e lavei muita roupa. . Vim para Sobral ainda menina com 10 anos para trabalhar em “casa de família”. Comecei trabalhando em uma casa na rua aí da frente. Passei um tempo grande como doméstica. Aos poucos, começaram a perceber meu jeito caprichoso para fazer comida e pediam para me liberar para cozinhar nas grandes festas de Sobral. . Trabalhei em muitas festas, grandes buffets, viajei para Fortaleza, pro Maranhão. Eu adorava festa, sempre fui festeira

Maria

Sou Maria, tenho 83 anos.  Faço aniversário hoje,acredita? Ah, foi ontem, é mesmo. Bom que minha filha tá aqui que ela vai me ajudando a lembrar da minha história. A velhice faz isso com a gente, as coisas vão apagando, alagando, ficam bem borradinhas. . Minha filha, eu tive oito filhos e três morreram. Dois dos meus filhos morreram de quebrante. É, isso mesmo. De tanto o povo olhar, curiar, maldizer, ficaram molinhos e morreram. . Memória? Vishe, deixa eu olhar pro céu pra eu pensar um pouco. Eu lembro muito bem da minha infância, deixa eu te contar que eu sempre gostei de brincar sozinha. Eu fazia uns foguinhos e brincava de casinha debaixo das moitas. Tinha a panela, o fogaréu, a comida de brincadeira. Quando eu me dava conta o pai chegava para ver se eu estava bem. Lembro do rosto dele até hoje. . Os meus sentidos estão melhores, minha filha. Já tive depressão, eu tinha medo de comer e morrer. Já escapei de um acidente de carro, a gente ia pr

Daniele

Sou Daniele, sou a primogênita de cinco irmãos, tenho 43 anos e dois filhos, Vitória e Vinicius. Sou filha da dona Isabel com muito orgulho e tenho um bem querer muito grande por essa rua, até me emociono de falar. . A família do meu pai sempre morou aqui mas a família da mãe é de Moraújo. Esse lugar sempre foi afetivo pra mim, foi aqui que brinquei na rua, tomei banho de chuva, joguei bola. . Sabe uma memória muito presente que eu tenho? O pai ia pescar no rio aqui atrás e ficávamos eu e meus primos esperando ansiosamente o trem passar lá na ponte. A gente ficava contando os vagões, um a um. Era essa a brincadeira. Ai que saudade! Até hoje recordo disso quando o trem passa lá em cima da ponte. Você já viu como é bonito?, eu lembro dessa brincadeira da gente. . Lembro que eu queria ir junto com o trem, saber quem estava lá dentro, quantas pessoas, se só tinha carga, queria ir embora com o trem. Até hoje quando estou com um problema eu vou lá pra margem pensa

Marieta

Sou Marieta, tenho 80 anos, moro há mais de 62 anos aqui nessa rua e nessa casa. Cheguei em 1958. . Eu vim para Sobral para sofrer. Nasci em campestre, um lugarzinho próximo a massapê. Depois disso eu vivi bolando no meio do mundo até parar aqui. . Eu faço aniversário no dia 01 de Janeiro, o dia do começo de tudo. Há muito tempo não sei o que é comemorar, eu vivo com a com a saúde em baixa. Moro aqui com três filhos, todos homens. Mas ao todo tive 13 filhos, nove ainda vivos. Três morreram de nascença e um morreu depois de grande, com 40 anos.  Um dos filhos que moram comigo, Francisco, nunca mais voltou ao que era depois que o pai morreu. Faz trinta anos da morte do Manuel e faz trinta anos que eu não faço ideia do que meu filho se tornou.  Ele conversa com o pai, fica indignado porque ele foi embora, fala alto. Todo mundo na rua sabe que ele é assim mas que é gente boa, não faz mal a ninguém. Ele já sumiu várias vezes, já encontramos ele na estrada do Massapê. Ele não quer t