Pular para o conteúdo principal

Joana









Eu só te peço uma coisa... eu vou te contar a minha vida, você pode publicar mas eu só não queria me ver em um retrato. Eu não gosto de retrato. Tudo bem?

.


Pode fotografar a casa, os móveis, tudo mas eu não gosto de fotografia minha, não gosto de me ver. Aquele retrato ali na parede não sou eu, então pode fotografar. Deixa eu pegar uma foto minha antiguinha pra você me ver jovem... mas pra falar a verdade eu nunca gostei de retrato. Só tenho essa foto pequenininha. .


Minha filha, eu me chamo Joana, tenho 60 anos e nasci em Butuca no patriarca, vim para Sobral aos 10 anos ser “pé de fogão” de família rica. Em toda casa que eu entrava eu era uma frutinha verde, era assim que os homens diziam você acredita? .


Eu fugi a vida inteira desses homens, os bichos ficavam atrás da gente. Por isso eu sempre dormia na minha casa, eu tinha medo. .


A minha virgindade está comigo até hoje. Eu sabia que se eu fizesse aquilo eu ia ter filho e eu não fiz. Eu sou sozinha, não tenho família, mas eu sou livre. Minha mãe morreu quando eu tinha um ano e meu pai morreu quando eu tinha nove. Eu aprendi a vida inteira a caminhar e me virar sozinha. Não me arrependo não, foi a melhor coisa. .


Eu ganhava 362 reais como doméstica e o patrão dizia que eu já tinha comida, tinha onde dormir, que esse dinheiro era quase um luxo. 

Aquele homem era um covarde. .


Hoje eu sou dona das minhas ventas e a isso eu chamo liberdade. Parece que eu não nasci para viver com homem, homem pra mim é negativo. .


Quando eu era mais jovem eu até sentia uns arrepios no corpo mas fugia quando percebia que podia me entregar. Nunca beijei, nunca nada. Só quem vai ter direito as minhas carnes será a terra. Guardo comigo a minha honra, assim como guardo meu útero e meus ovários. .


Mas na juventude eu aproveitei demais, fui a muitos forrós. Lembro de uns muito bons no aprazível. Eu vivia dançando. Sinto saudade da outra casa que eu morava, lá tinha um radinho que eu escutava música e começava a dançar. Hoje não tenho mais, fui esquecendo até de dançar. .

Sim, eu adoro estrela do mar. Aquela dali faz tempo que eu tenho, a outra ganhei de presente. 


Fica tudo aí embelezando a casa, me lembrando de brilhar.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Diana

Sou Diana,  a mais nova de uma família de cinco irmãos. Tenho 35 anos, dois filhos e 16 anos de casada.  A rua da palha é meu lar desde sempre, nasci aqui. Sou fruto do amor de Isabel e Raimundo, através dessa paixão dos meus pais herdei um amor imenso por esse lugar. . A minha história está profundamente ligada com a história do meu pai. Infelizmente, ele já se foi. Ainda dói muito, não consigo falar disso sem chorar, sem lembrar dos momentos que passei com ele. . Quando ele adoeceu eu fui a filha que pude me dedicar para cuidar dele integralmente. Eu mudei a minha vida inteira, sai do emprego, quase não conseguia estar com meu esposo, com minha filha, me dediquei a cuidar do pai inteiramente. . Ele confiava muito em mim, sabia que eu falava com os médicos, organizava a medicação, que eu brigava quando fosse preciso, que eu não ia deixar ninguém cuidar dele pela metade. Isso trouxe uma conexão muito forte entre a gente. Eu virei confidente, filha, amiga,...

Denise

Eu me organizei a semana inteira para estar aqui com as minhas irmãs e contar as nossas histórias junto, ouvindo umas as outras. Aqui na rua somos conhecidas como a “força D”. Denise, Diana e Daniele. É muito especial estarmos todas reunidas. . Sou a Denise, tenho 40 anos e essa rua é tudo para mim. Lembro que na enchente de 2009 tivemos que sair daqui e eu ficava contando as horas para voltar, para ver meus amigos, para passear no rio. . Eu sempre fui a mais afoita de todos os filhos. Era eu que fugia para as festas, que pulava a cerca, eu pensava assim: eu vou aproveitar bastante essa festa porque quando eu chegar pela manhã eu vou apanhar tanto do pai que eu vou fazer valer a pena. . Quando o pai sabia onde eu estava ele ia lá me pegar e eu voltava com ele na garupa da bicicleta. Quando chegava em casa ele olhava para mim e eu sabia exatamente o peso. . Sempre fui a mais danada, a mais festeira, a mala animada. Até hoje a minha casa é conhecida como a casa da f...