Pular para o conteúdo principal

Mulheres da rua 23 - Projeto


Recentemente ouvi a Luciana Mazeto, diretora do filme “Irmã”, expor a seguinte utopia como mote para o enredo do seu filme: “Como seria uma mulher que nunca foi ensinada a ter medo?” .

Parei ali, não consegui assistir a entrevista até o fim. Sonhei com essa frase, com o rosto da diretora, com o filme que nunca assisti. Atenta aos sinais do meu corpo resolvi elaborar aquilo de algum modo, estava na pira. .

Foi daí que tive a primeira ideia para o ensaio-encontro-exercício com as mulheres da minha rua. E se eu fotografasse durante um mês as mulheres da minha rua? E se a partir da fotografia eu conversasse com elas, contasse como fui parar ali, ouvisse qual foi seu último medo, seu último sonho, qual saudade, qual sua história? .

Me lancei! O resultado foi o encontro com muitas mulheres incríveis e suas histórias. 
Corpo povoado de energia e imensidão. Elas me autorizaram a postar seus retratos e alguns trechos de suas histórias aqui, mas o processo completo desse trabalho culminará em uma exposição na própria rua 23 de Setembro, espaço onde todas nós habitamos o mesmo endereço e carregamos no corpo marcas, medos e sonhos tão diferentes. .
.

Dedico esse trabalho a todas as mulheres, as de perto e as de longe, as que existem e as que sobrevivem, as que tem histórias e as que nem sabem que tem, as que calam e as que lutam todos os dias pelo direito de não calar. Olhemos ao redor! .

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Marieta

Sou Marieta, tenho 80 anos, moro há mais de 62 anos aqui nessa rua e nessa casa. Cheguei em 1958. . Eu vim para Sobral para sofrer. Nasci em campestre, um lugarzinho próximo a massapê. Depois disso eu vivi bolando no meio do mundo até parar aqui. . Eu faço aniversário no dia 01 de Janeiro, o dia do começo de tudo. Há muito tempo não sei o que é comemorar, eu vivo com a com a saúde em baixa. Moro aqui com três filhos, todos homens. Mas ao todo tive 13 filhos, nove ainda vivos. Três morreram de nascença e um morreu depois de grande, com 40 anos.  Um dos filhos que moram comigo, Francisco, nunca mais voltou ao que era depois que o pai morreu. Faz trinta anos da morte do Manuel e faz trinta anos que eu não faço ideia do que meu filho se tornou.  Ele conversa com o pai, fica indignado porque ele foi embora, fala alto. Todo mundo na rua sabe que ele é assim mas que é gente boa, não faz mal a ninguém. Ele já sumiu várias vezes, já encontramos ele na estrada do Massapê. Ele não quer t

Joana

Eu só te peço uma coisa... eu vou te contar a minha vida, você pode publicar mas eu só não queria me ver em um retrato. Eu não gosto de retrato. Tudo bem? . Pode fotografar a casa, os móveis, tudo mas eu não gosto de fotografia minha, não gosto de me ver. Aquele retrato ali na parede não sou eu, então pode fotografar. Deixa eu pegar uma foto minha antiguinha pra você me ver jovem... mas pra falar a verdade eu nunca gostei de retrato. Só tenho essa foto pequenininha. . Minha filha, eu me chamo Joana, tenho 60 anos e nasci em Butuca no patriarca, vim para Sobral aos 10 anos ser “pé de fogão” de família rica. Em toda casa que eu entrava eu era uma frutinha verde, era assim que os homens diziam você acredita? . Eu fugi a vida inteira desses homens, os bichos ficavam atrás da gente. Por isso eu sempre dormia na minha casa, eu tinha medo. . A minha virgindade está comigo até hoje. Eu sabia que se eu fizesse aquilo eu ia ter filho e eu não f

Diana

Sou Diana,  a mais nova de uma família de cinco irmãos. Tenho 35 anos, dois filhos e 16 anos de casada.  A rua da palha é meu lar desde sempre, nasci aqui. Sou fruto do amor de Isabel e Raimundo, através dessa paixão dos meus pais herdei um amor imenso por esse lugar. . A minha história está profundamente ligada com a história do meu pai. Infelizmente, ele já se foi. Ainda dói muito, não consigo falar disso sem chorar, sem lembrar dos momentos que passei com ele. . Quando ele adoeceu eu fui a filha que pude me dedicar para cuidar dele integralmente. Eu mudei a minha vida inteira, sai do emprego, quase não conseguia estar com meu esposo, com minha filha, me dediquei a cuidar do pai inteiramente. . Ele confiava muito em mim, sabia que eu falava com os médicos, organizava a medicação, que eu brigava quando fosse preciso, que eu não ia deixar ninguém cuidar dele pela metade. Isso trouxe uma conexão muito forte entre a gente. Eu virei confidente, filha, amiga, enfermei